ANDRÉ, M. Cotidiano Escolar e Práticas Sócio-Pedagógicas, In: Em Aberto, vol.11, n.º 53, Brasília, Jan – Mar / 1992, pp. 29-37
O artigo parte da idéia que os estudos do tipo etnográfico que focalizam o cotidiano escolar podem contribuir para o redimensionamento da prática pedagógica. Toma por base dados de três pesquisas realizadas em escolas de 1º grau para demonstrar que os estudos etnográficos constituem uma fonte de reflexão sobre a prática escolar, ponto de partida para um encaminhamento de alternativas visando a reconstrução da escola. O artigo está dividido em quatro partes: A tragetória da Abordagem Etnográfica na Pesquisa sobre a Escola, Da Necessidade de Construir a Categoria “”Cotidiano Escolar””, Revendo Estudos sobre as Práticas Escolares do 1º Grau e Algumas Questões nos Estudos sobre as Práticas Pedagógicas Bem Sucedidas. A primeira parte traça o caminho de aproximação da Educação com a Etnografia onde destaca autores, obras, eventos e instituições que tiveram papel importante. Nos anos 70, a pesquisa de sala de aula enfatizava as “”análises de interação””, que tinham como fundamento os princípios da psicologia comportamental. Como alternativa a estes estudos surge a abordagem etnográfica ou antropológica, que busca compreender e escrever a situação, revelar seus múltiplos significados, deixando que o leitor decida se as interpretações podem ou não ser generalizáveis, com base em sua sunstentação teórica e sua plausibilidade. No final dos anos 80, há um número considerável de dissertações, teses e relatórios de pesquisas nos Programas de Pós-graduação em Educação do Brasil que mencionam as abordagens qualitativas. Na segunda parte, o artigo analisa como a pesquisa etnográfica vem sendo utilizada nos estudos que focalizam o cotidiano escolar e defende a construção teórica da categoria cotidiano escolar a partir de autores como Heller, Lefébvre e Kosik. A terceira parte é constituída de uma revisão crítica dos objetivos, do enfoque teórico-metodológico e dos problemas encontrados em três pesquisas desenvolvidas em escolas de 1º grau. A primeira pesquisa tinha por objeto conhecer os trabalhos desenvolvidos por professoras que estavam tendo sucesso na alfabetização de crianças da escola pública, apesar dos limites de suas condições de trabalho; este estudo se restringia à dimensão pedagógica. A segunda pesquisa tinha por objetivo verificar o tipo de prática pedagógica que interfere de forma positiva no desempenho escolar das crianças das camadas populares; este estudo articulou as dimensões pedagógica e institucional. A terceira pesquisa analisou as relações sociais expressas no cotidiano escolar com ênfase nos movimentos de dominação e resistência; a diferença entre este e o segundo estudo está no enfoque teórico que passou a analisar as categorias de dominação e resistência numa perspectiva dialética. A análise das três pesquisas demontra que os estudos voltados para as situações do cotidiano escolar oferecem uma contribuição significativa no desvelamento da prática docente. A quarta parte do artigo levanta os pontos críticos das pesquisas sobre as práticas pedagógicas, tendo como referência as experiências bem sucedidas. A primeira questão refere-se aos critérios de escolha do professor, da escola ou da prática bem sucedida. A segunda questão é o risco possível de isentar os orgãos públicos de sua responsabilidade em assegurar condições dignas de trabalho ao professor, quando se mostra que mesmo em condições adversas alguns professores conseguem realizar um bom trabalho. A terceira questão é a crítica feita à metodologia empregada nessas pesquisas, que muitas vezes se limitam a descrever as práticas dos docentes. Na conclusão, o artigo traz algumas das contribuições da pesquisa de tipo etnográfico para repensar a formação docente e reconstruir o ensino de 1º grau.