Decisão anunciada pelo ministro Camilo Santana de barrar licenciaturas a distância deixa brecha para surgimento de um modelo híbrido e divide opiniões
Por Marcelo Menna Barreto
A decisão do Ministério da Educação de não permitir mais cursos de licenciaturas 100% a distância, anunciada nesta terça-feira, 5, pelo ministro Camilo Santana foi comemorada por educadores – que vêm alertando para os problemas provocados pela expansão desenfreada da EaD no país.
Daniel Cara, professor da Universidade de São Paulo (USP) e integrante da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, no entanto, vê uma contradição na nova normativa do MEC: “O ministro acerta na fala, mas ele erra na proposta”.
Ex-coordenador de Licenciaturas na USP, ele é categórico ao defender o ensino integralmente presencial. “Não só para licenciatura, mas para qualquer formação inicial”.
Na prática, para o educador, o ministro diz que quer proibir, “mas, está querendo criar um modelo híbrido. E a gente não aceita o modelo híbrido. Essa é a posição de todas as pessoas que defendem a educação”, evidencia.
Formação pelo exemplo
Para Cara, não há como ter modelo híbrido na licenciatura. “Até porque os professores vão lecionar presencialmente. Eu sou formador de professores hoje. Você também forma pelo exemplo. Eu diria até mais, você forma mais do que tudo pelo exemplo. Então, um bom professor gera alunos que, de fato, têm capacidade de dar conta das necessidades educacionais. Então, não faz sentido fazer um modelo híbrido”, explica.
Heleno Araújo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) afirma que a posição da entidade vai na mesma linha do que pensa Daniel Cara.
“A CNTE não aceita formação inicial de Profissionais da Educação a distância. Consideramos que a formação a distância deve ser utilizada na política de formação continuada”, declara.
Gabriel Grabowski, professor da Feevale, pesquisador que integrou o Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul e colunista do Extra Classe, entende que a decisão anunciada é necessária.
“Ninguém no mundo pratica formação de professores nesta escala e na modalidade única EaD. O Brasil cometeu um equívoco histórico e isso precisa ser corrigido imediatamente”, entende Grabowski, que está participando no momento do 9º Encontro Nacional das Licenciaturas, na Universidade do Vale do Taquari (Univates).
Fábrica de diplomas
Reafirmando ser favorável a proibição de toda a educação à distância na formação inicial, “não só da licenciatura, mas de qualquer curso universitário”, Daniel Cara vê, porém, possibilidades para exceções.
Seria o caso de regiões remotas, com alta complexidade logística. “É possível fazer um modelo híbrido em que a maior parte da carga horária se dê presencialmente, mas não toda. Agora, é em situação excepcional mesmo”, pontua.
O problema, diz, é que “nenhuma empresa quer trabalhar no interior do Amazonas, no interior da região do Pará, no interior do Pantanal, nas regiões mais remotas do Sul do país. Elas querem trabalhar nas grandes cidades com EaD. Então, o objetivo é fazer um curso barato em que a lucratividade com a EaD seja muito alta. É importante frisar isso”.
Ele reitera: o que precisa ser oferecido são condições para os estudantes realizarem um curso universitário de qualidade, algo impossível a distância.
“Esse curso universitário de qualidade é impossível ser realizado em EaD. A questão é o quanto o Brasil quer investir em formação de professores e o quanto ele é sério na formação de professores. Eu não acredito num país que faça uma fábrica de diplomas. Eu acredito num país que, de fato, se dedique à formação sólida dos estudantes, especialmente de professores”, completa.