JÉSSICA MAES
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Cerca de um quinto dos 5.570 municípios brasileiros, pelo menos, é considerado vulnerável a desastres climáticos relacionados a chuvas extremas, como as que atingiram o litoral norte de São Paulo no último Carnaval. Estas 1.038 cidades concentram 55,7% da população e muitas delas ficam na costa do país.
Os dados são do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), que monitora esses lugares diariamente, emitindo alertas sempre que a previsão do tempo aponta risco de chuvas fora do normal.
Entre os municípios estão São Sebastião, Ubatuba e outros da região que sofreu com deslizamentos. Foi por meio deste trabalho que o órgão alertou a Defesa Civil estadual sobre a ocorrência de chuvas fortes e o risco de desastres. A Vila Sahy, onde morava a maioria das 65 vítimas da tragédia, foi citada como uma área de alto risco para deslizamentos.
A maior parte das cidades monitoradas pelo Cemaden fica nas proximidades da costa, nas regiões Sudeste (403) e Nordeste (333). Os estados mais afetados são Minas Gerais, com 143 municípios monitorados, seguido de São Paulo, com 127, e Maranhão, com 84. A lista inclui todas as capitais brasileiras, exceto Palmas e Brasília.
Regina Alvalá, diretora substituta do Cemaden, explica que isso acontece porque, devido ao processo de colonização, as principais cidades brasileiras estão concentradas na costa. Além disso, é onde também estão as áreas com a topografia mais pronunciada, como a Serra do Mar e a Serra da Mantiqueira, em Minas Gerais. “Então, é aí que você tem maior concentração de população em municípios que podem ser impactados por desastres.”
O Cemaden foi criado em 2011, após fortes chuvas que mataram mais de 900 pessoas na região serrana do Rio de Janeiro. No mesmo ano, começou o monitoramento de 268 cidades, e já em 2012 o número aumentou para 821, até chegar às 1.038 acompanhadas atualmente.
Os municípios são considerados prioritários porque já tiveram desastres com mortes. O monitoramento é feito por meio de um mapeamento das áreas de risco, acompanhamento das chuvas em tempo real por meio de pluviômetros automáticos e da definição de limites críticos de precipitação que podem causar deslizamentos de terra ou inundações e enxurradas.
Na prática, esse último item significa que cada lugar e cada terreno vão ter um patamar diferente de vulnerabilidade às chuvas. Assim, um ponto pode precisar de muito menos chuva do que outro para que uma tragédia ocorra.
“Se você tem 100 milímetros em 72 horas em Campos do Jordão, por exemplo, [a terra] pode deslizar. Em outras regiões esse limiar é até menor e com 60 milímetros de chuvas acumulados em 24 horas ou 72 horas já pode deslizar”, exemplifica a especialista. Essa avaliação de risco é feita analisando 3.000 pluviômetros em todo o território nacional.
“Então, a gente precisa ir acompanhando a chuva que já caiu, a chuva prevista, as descargas atmosféricas –ou seja, os raios–, e os sistemas que causam chuvas, porque eles se deslocam”, diz.
Para que essa rede de segurança funcione, no entanto, é preciso que os alertas emitidos pelo Cemaden e outras instituições que atuam nessa área cheguem até a ponta, aos moradores de regiões vulneráveis. Isso acontece por meio das unidades locais da Defesa Civil, que devem avisar a população para que deixe as áreas de risco.
No entanto, segundo um artigo publicado no ano passado, 67% das defesas civis nos municípios enfrentam falta de verba, de pessoal ou de estrutura. A partir de um questionário aplicado em 1.993 cidades, 72% disseram que não têm orçamento próprio para a área.
Além disso, muitas vezes as equipes sofrem alterações quando o comando das prefeituras muda e, assim, uma rede que já tem déficits fica ainda mais fragilizada.
“As defesas civis precisam manter atualizadas as suas informações de telefone ou email para onde encaminhar esses alertas”, explica Alvalá. “É muito comum que quando acontecem as eleições de prefeitos e vereadores mude também a chefia da Defesa Civil. Quando muda o secretário, muda também o telefone e o que acaba acontecendo é que esses dados não são atualizados.”
Outro problema é que a própria lista de municípios acompanhados não é atualizada desde 2021 –e, de lá para cá, estão acontecendo desastres com mortes em outros lugares. Exemplos disso são as cidades baianas de Amargosa, Itaberaba, Jucuruçu, Macarani, Ruy Barbosa, Aurelino Leal, São Félix do Coribe, Ubaitaba, Belo Campo e Barra, que somaram 14 mortes nas fortes chuvas que provocaram enchentes em vários pontos do estado em 2021.
“A gente tem observado um aumento da frequência de eventos extremos em algumas regiões do Brasil com chuvas torrenciais e mortes. Certamente, agora, se faz crucial rever essa lista”, aponta a diretora substituta do Cemaden. “E ela certamente vai aumentar.”
Na última semana, a ministra do Meio Ambiente e da Mudança do Clima, Marina Silva, defendeu a decretação de emergência permanente nos 1.038 municípios monitorados pelo Cemaden. O objetivo, segundo ela, seria possibilitar o desenvolvimento de ações continuadas de prevenção e facilitar a liberação de recursos.
Fonte: https://br.noticias.yahoo.com/metade-dos-brasileiros-vive-em-151800513.html