A unidade de ensino chegou a afirmar para as alunas que a escola não poderia ser responsabilizada por queixas de possíveis casos de assédio cometidos por alunos homens por conta da forma como elas estavam vestidas. Em nota, a Secretaria da Educação informou que vai ‘averiguar o ocorrido e reorientar os funcionários’.
Por g1 SP — São Paulo
Alunas da Escola Estadual Parque Anhanguera, na Zona Norte de São Paulo, afirmam que foram retiradas de sala de aula por funcionários da unidade escolar por estarem usando cropped, regatas e calças rasgadas na última quarta-feira (9).
Segundo uma comunicado redigido pelos alunos e postado em uma rede social, os funcionários da escola passaram de sala em sala pedindo para que todas as alunas mulheres se levantassem, e aquelas que estivessem com uma roupa que a escola considerasse inapropriada foram retiradas da sala e mandadas para a secretaria da escola.
As alunas que estavam usando moletons e casacos informaram que foram obrigadas a tirarem as peças para que as funcionárias conferissem a roupa que estava por baixo.
As alunas ainda foram informadas na secretaria que a escola não poderia ser responsabilizada por queixas de possíveis casos de assédio cometidos por alunos homens por conta da forma como elas estavam vestidas.
A diretoria ainda alegou que as jovens poderiam ser impedidas de entrar na escola se a roupa não estivesse de acordo com a vestimenta aceita.
O advogado Ariel de Castro Alves, presidente do Grupo Tortura Nunca Mais e membro do Instituto Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, afirmou que a atitude da escola contraria “frontalmente as finalidades educacionais e sociais da escola. E mostra que alguns funcionários e dirigentes de escolas desconsideram as leis vigentes no país, como o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Maria da Penha e o Estatuto da Juventude”.
“Nós somos jovens meninas, mulheres e temos muito respeito por quem vem antes de nós. Porém, estamos no século 21 no ano de 2022 e é inadmissível que ainda hoje episódios como este aconteça dentro do espaço escolar onde deveríamos ser acolhidas e não censuradas com o argumento de culpar a roupa da mulher pelo assédio que ela sofre. Nós nos sentimos desrespeitadas e ridicularizadas, fomos constrangidas perante toda a comunidade escolar e expostas dentro das salas de aula”, diz o comunicado.
“A nossa cultura prefere ensinar as vítimas a terem medo e sentirem culpa pela roupa que usam, do que educar as pessoas para que respeitem outras pessoas e principalmente mulheres, sejam elas, alunas, professoras, irmãs, mães, avós, cunhadas, vizinhas, amigas etc”, completou.
Em nota, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) informou que a abordagem citada pelas alunas “não condiz com as orientações da Pasta. A Diretoria de Ensino Norte 1, responsável pela unidade, irá averiguar o ocorrido e reorientar todos os funcionários. Tanto a Seduc-SP quanto a Diretoria de Ensino e a unidade escolar estão à disposição da comunidade para acolhimento e para prestar esclarecimentos”.
Ainda segundo o Ariel, submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento fere o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), e o acusado pode receber detenção de seis meses a dois anos.
“As funcionárias e funcionários que tiraram elas da sala e que fizeram revistas para verificar as roupas que as adolescentes usavam devem ser investigadas pela prática desse crime, de submete-las a vexame e constrangimento”, afirma.
“Os direitos ao respeito, dignidade e liberdade também estão no ECA, ele também prevê que crianças e adolescentes não podem sofrer discriminação e opressão. Essas violações precisam ser verificadas pelo conselho tutelar mais próximo na escola e pela promotoria da infância e juventude, por meio de inquérito civil que pode gerar até o afastamento dos gestores da escola”, completou.
Após o ocorrido, as alunas realizaram um protesto na unidade de ensino na última sexta-feira (11).