Jaqueline Deister
Wilson Witzel em inauguração de colégio militar do Corpo de Bombeiros em Volta Redonda (RJ) / Foto: Alessandra Neves
No início do mês de setembro o governo federal apresentou o Programa Nacional de Escolas Cívico-Militares. A ideia é implementar o modelo de gestão militar em 216 escolas até 2023. De acordo com a proposta, os militares não substituem os professores e atuam na área administrativa e também como tutores.
A adesão ao programa é voluntária. As escolas deverão fazer consultas públicas junto à população atendida para ver se existe interesse em ingressar na proposta oferecida. Contudo, não é bem isso que tem ocorrido no município de Petrópolis, na região serrana do estado do Rio.
Em julho, a prefeitura da cidade anunciou que em 2020 seria inaugurada uma escola cívico- militar destinada ao ensino médio em parceria com o governo do estado. Em setembro, a comunidade escolar do Liceu Municipal Carlos Chagas recebeu a notícia de que a unidade, que existe há 19 anos, e atende 510 estudantes do 6° ao 9° ano do Ensino Fundamental, seria desativada para dar lugar a escola militar.
Diante da informação, professores, alunos, funcionários e pais iniciaram em setembro uma campanha na internet contra o fechamento da escola. O abaixo-assinado conta com quase 2 mil assinaturas. Segundo um professor do Liceu que preferiu não se identificar, não houve nenhum tipo de consulta com as famílias e a equipe escolar sobre a mudança. Ele ressalta ainda que todos defendem a permanência da instituição de ensino.
“Reivindicamos que a escola não saia de lá, ou, se sair, que consigam um prédio no entorno que possa abrigá-la para que toda a comunidade escolar seja mantida e que o transtorno seja o mínimo possível. Não somos contra a implantação da escola militar, o problema é implantá-la no lugar onde hoje funciona uma escola e funciona bem e atende a uma comunidade carente com um número expressivo de alunos”, destacou o educador.
A mobilização gerou repercussão e houve uma reunião entre a comunidade escolar e a Secretaria de Educação do município com a presença do Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação de Petrópolis (SEPE). Na ocasião, a prefeitura alegou que o prédio do Liceu Carlos Chagas é do estado e que ele teria que ser cedido não havendo nenhum outro nas proximidades que pudesse abrigar a instituição de ensino.
Daniel Salomão é o coordenador geral do SEPE. Segundo ele, a entidade não é contra as escolas estaduais, mas o processo envolvendo o Liceu Carlos Chagas foi marcado pela falta de diálogo com a comunidade escolar, diretamente afetada com a mudança, e, na avaliação de Salomão, esse foi um dos principais erros da prefeitura. O coordenador destaca também que o sindicato está atuando de forma a impedir o fechamento da unidade.
“Fizemos uma representação jurídica no COMED, Conselho Municipal de Educação, e também uma representação no Ministério Público do Estado. Marcamos um movimento popular, um abraço comunitário à escola e também uma reunião para definir o rumo do nosso movimento”, explica.
De acordo com a equipe da escola, a prefeitura disse que os estudantes seriam realocados em dois colégios no centro da cidade e que os 60 profissionais do Liceu Carlos Chagas teriam prioridade no edital de remoção para a escolha de uma nova unidade de ensino para atuar.
Procurada pelo Brasil de Fato, a prefeitura se limitou a dizer que a Secretaria de Educação ainda está alinhando com o estado a instalação da escola militar em Petrópolis e que o Liceu Municipal Carlos Chagas segue funcionando normalmente, não havendo previsão de fechamento da unidade.
Educação militarizada
Outras cidades do estado do Rio já receberam escolas cívico-militares este ano. Em junho, o governo de Wilson Witzel (PSC) inaugurou os primeiros colégios do Corpo de Bombeiros em Volta Redonda, na região do médio paraíba e em Miguel Pereira, no sul fluminense. As unidades estão estruturadas para atender 120 estudantes em horário integral.
Na época, Witzel declarou que a meta é inaugurar escolas militares em todo o estado. O deputado estadual Flavio Serafini (PSOL), que preside a Comissão de Educação da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), destaca que não foi apresentado nenhum projeto pedagógico para a implementação de escolas militares no estado do Rio até o momento.
“Esse anúncio do governador de que vai abrir escolas militares não tem nenhuma sustentação do ponto de vista de um projeto de melhoria para a educação, virou uma moeda eleitoreira, onde deputados se apresentam como padrinhos de escolas militares nas diferentes regiões do estado, mas não têm sequer um projeto consistente. É um erro achar que passar a gestão da escola para militares vai melhorar a qualidade, o que melhora a qualidade é investimento, valorização dos profissionais e boa condição de estudo para os alunos. O que militar nas escolas faz é cercear o espaço de liberdade dentro das escolas”, afirma o deputado.
O Brasil de Fato procurou a Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro para esclarecimentos com relação ao projeto de escolas cívico-militares. O órgão não retornou até o fechamento desta reportagem.