UFRJ, por exemplo, afirma que tem verba para pagar servidores só até novembro
Um levantamento do GLOBO aponta que 17 instituições federais de ensino superior têm risco de interromper suas atividades até o fim do ano por falta de dinheiro para pagar contas básicas, como água e luz. Entre elas, estão as universidades federais do Rio de Janeiro (UFRJ), da Bahia (UFBA), do Pará (UFPA) e de Juiz de Fora (UFJF).
As universidades federais tiveram, em 2022, mais de R$ 400 milhões cortados em recursos discricionários. Diferente dos gastos obrigatórios (que pagam os salários, por exemplo), estes podem ser remanejados para outras áreas. No entanto, pagam aspectos fundamentais para o funcionamento das instituições, como as contas de água, luz, limpeza, segurança e manutenção predial, além de bolsas, auxílio estudantil, equipamentos e insumos.
A UFRJ só consegue pagar as contas até setembro. “A expectativa é de que as empresas ainda prestem serviço no mês de outubro. Mas se nada acontecer em termos de recomposição orçamentária, em novembro e dezembro podemos ter que suspender contratos e interromper as atividades em toda universidade”, informou a instituição.
A Universidade Federal de Santa Catarina projetou as despesas da universidade até o final do ano. Após os bloqueios, “estaria com o seu funcionamento comprometido até meados do mês de novembro”, informou a instituição.
Prejuízos
“Não há mais o que cortar, o que reduzir de despesas”, informou a UFPA. “Já foram realizados todos os ajustes internos possíveis”, afirmou a Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará , que trabalha em 2022 com o segundo menor orçamento de sua história.
A Universidade Federal de Alfenas vai precisar diminuir o número de bolsas acadêmicas, a compra de insumos para aulas práticas, obras em andamento e a quantidade de atendidos pela assistência estudantil. Estudantes mais pobres poderão perder auxílios fundamentais para continuarem seus estudos. Mesmo assim, a instituição pode não conseguir chegar ao fim do ano com todos os seus serviços abertos.
A Universidade Federal de Lavras precisou demitir quase 150 funcionários terceirizados. Eles correspondiam a 25% dos que atuavam na limpeza, manutenção e segurança.
Sem dinheiro para combustível, a Universidade Federal da Grande Dourados informa que corre risco de não conseguir ofertar aulas a comunidades indígenas e camponeses que estudam na modalidade de alternância e precisam se deslocar de suas localidades. A Universidade Federal de Sergipe proibiu o uso de ar-condicionado em todo o câmpus. A Universidade de Brasília cortou até em livros. A Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro estuda diminuir o uso de recursos do portal de internet.
A situação dos prédios universitários também é prejudicada com os cortes, que atingem os orçamentos de manutenção. A Universidade Federal de Alagoas (Ufal) ainda sofre com estragos de uma tempestade que atingiu Maceió em maio. Mas não há dinheiro para o conserto de telhados, infiltrações, paredes mofadas e salas interditadas.
A Universidade Federal para a Integração Latino-Americana (Unila), que está em fase de implantação, não vai conseguir conseguir avançar com as construções e licitações planejadas e continuará pagando aluguel.
A Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre ganhou um prédio novo da União. Mas o imóvel só poderá ser usado após reformas, que não poderão ser feitas por conta da falta de dinheiro disponível.
Outra consequência dos cortes serão dívidas milionárias para 2023. A Universidade Federal do Rio Grande fechará o ano com um débito de R$ 9,6 milhões. A dívida da Ufal deve chegar a R$ 20 milhões. A Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) afirmou que, pela essencialidade do serviço, “essas instituições não podem considerar a interrupção de atividades como possibilidade”. No entanto, afirmou que “após repetidos cortes orçamentários as universidades não têm como honrar com os compromissos assumidos para seu funcionamento”. Para piorar, o cenário que está sendo debatido no Congresso não é nada animador.
“Fomos informados, por meio do Fórum de Pró-Reitores de Administração e Finanças e Planejamento, que haverá novo corte de 12% para o projeto de lei orçamentário de 2023. Dessa forma, não há universidade pública federal que consiga sobreviver”, afirmou Dyomar Toledo Lopes, Pró-Reitor Pró Tempore de Administração e Finanças da Universidade Federal de Jataí, em Goiás.
O levantamento de O GLOBO procurou todas as 63 universidades federais do país, durante um mês. Destas, 54 responderam aos questionamentos.
Rotina de apertos
As universidades federais têm sido alvo constante dos contingenciamentos e cortes do governo Bolsonaro. O orçamento discricionário, que já foi R$ 12 bilhões em 2011, caiu até 2021, quando chegou a R$ 4,4 bilhões. Neste momento, todas as universidades estavam apenas no sistema remoto. Por isso, as despesas também diminuíram. Em 2022, porém, a volta presencial não garantiu uma recomposição adequada, apesar do crescimento para R$ 5,1 bilhões. Ao contrário do que prevê a projeto de lei orçamentária para o ano que vem, os reitores afirmam que o orçamento precisa subir, pelo menos a níveis de 2019, quando as instituições tiveram R$ 5,7 bilhões para gastos discricionários.
Em nota, o MEC não respondeu sobre os cortes já realizados, mas afirmou que os novos bloqueios previstos pelo Ministério da Economia não vão acarretar em impactos financeiros nas instituições federais de ensino.