Das 175 vagas de graduação para 2018, 125 serão oferecidas pela Fuvest e 50 serão selecionadas pelo Enem via Sisu (28,6%); destas, 15 serão para alunos de escola pública pretos, pardos e indígenas.
Por Ana Carolina Moreno, G1 – 01/07/2017
Pela primeira vez em mais de 100 anos de história, a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) vai aplicar uma política de cotas raciais para os ingressantes no curso de graduação em medicina mais prestigiado do país.
Nesta sexta-feira (30), a Congregação da faculdade (órgão máximo de decisão da FMUSP) aprovou a adesão parcial ao Sistema de Seleção Unificada (Sisu), que usa a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para selecionar estudantes. A informação foi confirmada ao G1 na manhã deste sábado (1º) pelo diretor da FMUSP, professor José Otávio Costa Auler Júnior.
Segundo ele, 50 das 175 vagas de medicina em 2018 serão selecionadas via Sisu/Enem, e 125 continuarão oferecidas pela Fuvest. “Quem trouxe a proposta foi o Conselho de Graduação. É uma proposta bem completa. Foi aprovada sem modificação. Foi uma votação bem expressiva”, afirmou ele. Ainda de acordo com o diretor, os demais cursos da faculdade (fonoaudiologia, fisioterapia e terapia ocupacional) também terão uma parte das vagas destinadas ao Sisu.
Todos os anos, a faculdade, localizada nas Clínicas, Zona Oeste de São Paulo, abre 175 vagas para novos calouros de medicina. Segundo nota publicada pelo Centro Acadêmico Oswaldo Cruz (Caoc), a maioria dos membros presentes na reunião desta sexta aprovou dividir essas 175 vagas em 2018 da seguinte forma:
• Fuvest: 125 vagas (ou 71,4% do total) seguem destinadas ao vestibular tradicional da Fuvest, que já aplica uma política de bônus progressiva aos estudantes de escola pública, incluindo bônus adicional a estudantes que se autodeclarem pretos, pardos e indígenas (PPI)
• Sisu: 50 vagas (ou 28,6%) serão oferecidas pelo Sisu 2018 aos estudantes inscritos no Enem 2017; dessas 50 vagas, 10 serão reservadas para candidatos de ampla concorrência, 25 para candidatos que tenham feito o ensino médio em escola pública, e 15 vagas para candidatos da rede pública que se autodeclarem pretos, pardos e indígenas.
Isso quer dizer que, pela primeira na vez na história, a Faculdade de Medicina da USP terá uma política específica de cota racial. No total, 8,6% de todas as vagas para novos alunos em 2018 será reservada para pretos, pardos e indígenas.
No curso de fisioterapia, 22 vagas seguirão na Fuvest, e três serão destinadas, pelo Sisu, a estudantes de escola pública PPI. Das 25 vagas do curso de fonoaudiologia, cinco vão ser destinadas ao Sisu (três para estudantes de escola pública, e duas para estudantes de escola pública que se autodeclarem pretos, pardos e indígenas). Já no curso de terapia ocupacional, o total também será de 25 vagas, e três serão selecionadas pelo Sisu (duas para alunos de escola pública e uma para alunos de escola pública PPI).
De acordo com José Otávio Auler, o principal motivo da adesão parcial da FMUSP ao Sisu é a tentativa de acelerar o processo de inclusão de estudantes oriundos da escola pública na Universidade de São Paulo. A meta da instituição é ter, em 2018, 50% dos seus calouros vindos da rede pública de ensino médio. Em 2017, esse patamar bateu recorde, mas ainda ficou em 36,9%.
“Parece que o Inclusp, pelo que estavam mostrando ontem [na reunião], não estava conseguindo bater a meta. Então a questão é ampliar um pouco as possibilidades para estudantes de outras áreas do país, com o Enem. Com isso talvez a gente consiga bater a meta mais rapidamente e fazer a inclusão, os resgates sociais”, disse o diretor da FMUSP.
Ele disse que o aumento da adesão de mais unidades, e da destinação de mais vagas da USP ao Sisu, é um “processo evolutivo” que acontece progressivamente.
Mas, de acordo com Auler, o vestibular da Fuvest seguirá, em 2018, selecionando a maior parte dos calouros de medicina da faculdade. “A Fuvest vem trabalhando há 40 anos. Na Fuvest não modificou nada, o que modificou foi que, das 175 vagas, 50 foram para o Sisu”, disse ele, lembrando que estudantes de escola pública têm direito a bônus na nota da Fuvest pelo Inclusp.
As faculdades da USP têm autonomia para definir o número de vagas destinadas ao Sisu, e o Conselho Universitário da USP (CO) é responsável por referendar as decisões e definir a tabela geral de vagas do vestibular. A reunião que deve aprovar a tabela de vagas da USP em 2018 está agendada para a próxima terça-feira (4).
Histórico da USP no Enem
Desde 2015, as unidades da universidade possuem autonomia para aderir ou não ao Sisu. No primeiro ano, 85 dos 143 cursos de graduação da USP decidiram aderir ao Enem parcialmente (incluindo a Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, com 10 vagas para alunos de escolas públicas). Os outros 58 decidiram manter 100% das vagas no processo seletivo da Fuvest (incluindo a Faculdade de Medicina de São Paulo).
Depois de um primeiro ano de experiência, o número de vagas da USP destinadas ao Sisu subiu 57%, mas ainda sem a adesão da FMUSP (veja aqui o quadro completo do Sisu 2017). No mesmo período, a quantidade de vagas reservadas para a cota racial cresceu 376%.
Democratização do acesso
Em nota publicada em sua página oficial no Facebook, nesta sexta, o Caoc considerou a decisão uma “vitória extremamente importante, uma vez que representa um primeiro passo para a democratização do acesso à universidade”.
O centro acadêmico disse ainda que “a Faculdade de Medicina é um dos últimos cursos a aderir ao Sisu, mantendo-se um dos mais brancos e elitizados de toda a USP. Esperamos que, com essa vitória, esse panorama se altere e a FMUSP se pinte de povo”.
A entidade estudantil, porém, afirmou que também é favorável à instituição de cotas no vestibular da Fuvest. Hoje, o vestibular tradicional da USP mantém uma política de ação afirmativa baseada apenas no sistema de bonificação, mas não reserva vagas a determinados candidatos.