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Charles Nisz

No vilarejo indiano de Thulasendrapuram, um político local faz uma oferenda de leite para um dos milhares de deuses hindus em nome de Kamala Harris.

A conexão da pequena vila indiana com a eleição nos EUA é parte da biografia de Kamala, a vice de Joe Biden na chapa democrata vencedora nas eleições americanas.

Se o senador de 78 anos por Delaware é discreto, sua jovem companheira de parlamento e de chapa tem perfil, digamos, mais enérgico.

Kamala é fruto de uma união incomum para os Estados Unidos dos anos 1960.

ShyamalaGopalan, mãe da candidata, emigrou da Índia para os EUA para estudar Biologia na Universidade de Berkeley.

O pai, Douglas Harris, negro jamaicano, estudou Economia na mesma universidade.

No caldeirão político e social de meados dos anos 1960, nasceram Kamala (cujo nome significa flor de lótus em sânscrito) e Maya Harris, sua irmã caçula.

Aos 56 anos, a vice de Biden é formada em Ciência Política e Economia pela Universidade Harris, uma das mais prestigiadas pela comunidade negra norte-americana. Além disso, tem diploma de Direito pela Universidade da Califórnia.

Será a primeira mulher a ser vice-presidente dos EUA.

Assim como foi a primeira mulher de ascendência asiática a se tornar senadora e a segunda negra a ser eleita nos 240 anos de história do Senado americano.

Sua trajetória profissional também é pautada pelo pioneirismo: Kamala foi a primeira negra a ser procuradora no estado da Califórnia.

Em 2010, mais um feito notável: foi a primeira mulher eleita como procuradora-geral do estado da costa Oeste americana.

Durante seu mandato como procuradora-geral, Kamala defendeu a união de pessoas do mesmo sexo – a Califórnia foi um dos primeiros estados a adotar essa legislação, processou traficantes de drogas e armas e também lutou pela implantação de medidas contra as mudanças climáticas.

Uma trajetória muito diferente de Mike Pence, o vice de Trump – conhecido por lutar contra o direito ao aborto e contra o casamento gay.

Outra faceta de Kamala é sua produção acadêmica.

Seu livro Smarton Crime, publicado em 2009, em conjunto com a jurista Joan Hamilton, é um texto-base para lidar com o problema da reincidência criminal.

Uma visão muito diferente do governo Trump, cuja política para a criminalidade consiste apenas em encarcerar mais gente – sejam brancos, negros ou latinos.

Como procuradora, Kamala usou a educação e a reinserção profissional para impedir que delinquentes retornassem ao crime.

Sua trajetória até a vice de Biden foi longa e tortuosa.

Em 2019, Kamala firmou candidatura para as prévias democratas – no afã de ser a primeira mulher presidente dos EUA.

Desistiu em dezembro daquele ano, mas 2020 traria uma surpresa – Biden, o vencedor das prévias, bateu pé em favor de seu nome para compor a chapa.

Não é difícil entender porque Biden escolheu Kamala num rol de 12 políticas mulheres.

Em Washington, ela foi uma das mais ferrenhas opositoras ao atraso político representado pela gestão Trump. Votou contra 12 das 15 indicações ministeriais do mandatário por falta de experiência e conflitos de interesses com os nomes indicados.

Também se opôs às duas indicações de Trump para a Suprema Corte – falava com conhecimento de causa por ser advogada e ex-procuradora estadual.

As políticas imigratórias de Trump foram outro cavalo de batalha da senadora democrata, já que ela própria é fruto da união de dois imigrantes de minorias étnicas.

Suas propostas para restringir o uso de armas de fogo, elevar o salário mínimo pra US$ 15 por hora, implantar um sistema nacional de saúde e aumentar os impostos sobre os bilionários e taxar menos a classe média americana – tão engasgada como a nossa – encantaram Biden.

Se ele foi responsável por construir consensos a agregar moderados até mesmo do partido rival, foi Kamala quem deu forma às plataformas sociais da campanha.

Um dos momentos mais singelos da campanha foi quando disse a uma garota em uma conferência por vídeo que “uma menina como ela também poderia ser candidata”.

Kamala deu nova cara e ânimo à campanha democrata – Biden era jocosamente tratado pelos republicanos como “sleepy Joe” (José dorminhoco).

Por conta dos 78 anos, o democrata será o mais velho presidente americano a ser empossado.

Se disputar o segundo mandato, teria longevos 82 anos em 2024 – o próprio Biden pediu uma vice jovem por esses motivos.

Kamala é considerada a candidata natural do partido democrata no próximo pleito.

Sem querer, ela já redefiniu a política americana.

É bem possível que ela seja mais uma vez pioneira e se torne a primeira mulher a ser presidenta dos EUA.

Fonte: https://www.diariodocentrodomundo.com.br/quem-e-kamala-harris-a-primeira-mulher-negra-a-ocupar-a-vice-presidencia-dos-eua/