Por Rodrigo Motta

 

Este texto vem trazer uma reflexão sobre um assunto recente e sem precedentes: a privatização de presídios, em comparativo com o último censo prisional realizado no País.

É de conhecimento que compete aos entes da União a responsabilidade quanto à manutenção de presídios. Tal assunto vem à tona com o discurso atual dos representantes, que cravaram a ideia quimérica de que o preso está ocioso e, por isso, a criminalidade e reincidência andam em alta no Brasil.

 

A privatização penitenciária

 

Historicamente, no Brasil, os presos normalmente eram aqueles que ficavam longe do convívio social (por isso presídios longe das metrópoles). A aposta era de que, durante o tempo que estivessem presos, a sociedade estaria na maior e perfeita harmonia. Ledo engano.

Após o advento do Código Penal, com suas alterações posteriores, e da Lei de Execuções Penais – em que a premissa era a ‘ressocialização’ da figura do preso –, percebeu-se que os presídios não sofreram ‘modernizações’ à medida em que a sociedade evoluía. Logo, conclui-se, na prática, que a premissa de ressocializar-se veio a calhar.

O último relatório do Sistema Penitenciário Nacional, confeccionado em 2016, unificou e divulgou algumas informações em formas de gráficos. Logo, vamos acreditar nesse relatório como sendo o verdadeiro para fins de discussão.

Deixando de lado os discursos quanto à prisão em segunda instância e a massificação de prisões cautelares – diga-se desregradas –, tem-se aproximadamente 368.049 vagas no sistema prisional e, nesse mesmo espaço, 726.712 pessoas presas. Logo, o déficit superou 197,4% em 2016 (e, em tempos atuais, ultrapassa 800.000, sem que tenham sido construídos novos presídios).

O fato é que esses integrantes da massa carcerária certamente ganharão a liberdade em algum momento. Assim, o primeiro questionamento a ventilar seria: como voltarão às ruas aqueles tidos como banidos?

Em 16 anos, a taxa de aprisionamento superou 352%. Durante o lapso temporal, a população brasileira não acompanhou essa evolução. Do perfil da massa carcerária, 46% são negros enquanto 54% entre caucasianos, indígenas, amarelos entre outros.

O mesmo levantamento aponta que 51% tem o ensino fundamental incompleto (o que já representa a omissão do Estado no acesso à educação) e 14% com ensino fundamental completo. Essa porcentagem reflete 482.645 presos nesta situação. Além disso, 37% entre os presos estão casados e/ou em união estável enquanto 60% são solteiros.

Dentre os mais de 2 mil tipos penais, 26% dos homens e 62% das mulheres estão presos pela legislação de drogas.

O mais impactante do relatório é que apenas 15% dos presos estavam envolvidos em atividades laborais, internas e externas aos estabelecimentos penais, representando o total de 95.919 pessoas. Neste viés, 33% não recebem quaisquer remunerações e 41% com menos de ¾ do Salário Mínimo.

Assim, se nem o próprio Estado consegue dar a oportunidade de ressocialização a quem ele prendeu, não oferece estudos e qualificação adequada, convívio com a família e uma reinserção, ainda que gradual, perante a sociedade, como seria se adotássemos a privatização, em que se busca o lucro?

Ao que tudo indica, haverá mão de obra escrava dentro dos presídios. Além disso, como os estabelecimentos penitenciários estão (e continuarão) amontoados, a tendência seria uma criminalização maior ainda. Afinal, vivenciaríamos o escambo em troca de melhores condições prisionais. E encerro novamente perguntando: como voltarão às ruas aqueles tidos como banidos?

 

Fonte: https://canalcienciascriminais.com.br/a-privatizacao-penitenciaria/?fbclid=IwAR1SM5X_nDninndD331nX_4MPtQ6R2OHhpZyOKqmN4N53RxHf3_pTdckxf4